segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Clarice Lispector



Conheci Clarice Lispector através de uma professora de português, ela me apresentou o livro “A hora da estrela”. Sempre gostei de literatura, mas tenho um probleminha com os autores... Lembro dos títulos dos livros que li, porem nunca me vem na memoria seus autores...
Clarice Lispector foi a primeira e única  a ficar gravada em minha memoria.
Lendo “A hora da estrela” me apaixonei por Macabéa, sua vida, sua trajetória, seu sofrimento, um livro que me emocionou. Lendo outras obras fui cada vez me apegando a essa escritora maravilhosa, o texto “Cem anos de perdão” do livro “Laços de família” me lembrou a infância quando roubava rosas e sua frase que me identifica melhor é a “eu não decifrei a Esfinge, mas ela também não me decifrou". Não sou uma pessoa que entenda profundamente de literatura, nem tão pouco alguém que possa fazer alguma critica sobre qualquer tipo, sou apenas um humilde fã de Clarice Lispector, não conheço toda sua obra, nem vou analisar seu profundo trabalho.
Se me perguntar sobre Clarice (olhe a intimidade) não responderei com palavras bonitas nem complicadas, tão pouco com muitas frases dela, apenas direi que me identifico com algumas de suas obras, de sua simplicidade (em minha inexperiente opinião literária). Amo seu trabalho pois vejo neles a simplicidade do cotidiano, cotidiano que poderia ser o meu.
Não sou bom em escrever, escrevo aqui por distração, robe ou qualquer outro motivo que me leve a relaxar, não sou bom com as palavras escritas. Pesquisando por esse universo que é a internete encontrei um pequeno trecho que sintetiza minhas palavras e pensamentos sobre Clarice Lispector...

Isso porque Lispector não nasceu para ser entendida e sim para ser sentida. Seus livros são uma confluência de paradigmas absurda e possui trechos tão intimistas que transportam ao leitor ao seu obscuro da alma, ao fato de ser e ao sentir. Era tão inconstante que morreu gritando para a enfermeira “VOCÊ MATOU O MEU MELHOR PERSONAGEM!”.

E assim tento mostrar com minhas palavras e algumas de um estranho o que penso e sinto sobre essa brilhante mulher! 


A Hora da Estrela



Rodrigo S. M., o narrador, constitui um dos personagens centrais de "A Hora da Estrela", de Clarice Lispector. Ao mesmo tempo em que cria e narra a vida de Macabéa, identifica-se com ela, mesmo quando a agride. Dessa forma, você já deve ter percebido que o texto é metalinguístico: um autor - narrador que fala de sua própria obra e busca nela e com ela conhecer-se e reconhecer-se.

Macabéa é alagoana, virgem, ignorante, tem dezenove anos e diz-se "datilógrafa". Veio para o Rio de Janeiro com uma tia que cuidara dela desde os dois anos de idade. Quando a tia morre, Macabéa muda-se para um quarto que divide com quatro moças que trabalhavam nas Lojas Americanas: Maria da Penha, Maria Aparecida, Maria José e Maria.

Raimundo, o patrão de Macabéa, avisa-lhe que será despedida (Macabéa errava demais na datilo­grafia, ficará apenas com Glória (a colega de Macabéa na firma e que se considerava sensual e bonita). Macabéa gostava de ouvir a Rádio Relógio porque os locutores falavam "palavras diferentes", embora ela desconhecesse os significados e não soubesse o que fazer com as informações.

Um dia em que chovia muito, Macabéa encontrou Olímpico de Jesus, que se apresentou como Olímpico de Jesus Moreira Chaves, metalúrgico, paraibano. Os dois apresentam ruídos no processo de comunicação: ela por não saber e não ter o que dizer e ele por se sentir superior, principalmente em relação ao aspecto linguístico, porém pouco sabia. Olímpico era ambicioso, era capaz de qualquer ato para ascender socialmente. Até que ele conhece Glória e resolve afastar-se de Macabéa.

Com o rompimento, Macabéa compra um batom vermelho, pinta os lábios no banheiro da firma em busca da identidade desejada: a atriz Marilyn Monroe. Glória zomba da colega, contudo resolve convidá-la para um lanche em sua casa no domingo. Em seguida, indica-lhe um médico.

O médico, que não gostava de trabalhar com pobres e para pobres, destrata Macabéa e ela, mesmo assim, agradece. Constata-se que Macabéa está com tuberculose.

Quando ela volta a falar com Glória, esta indica-lhe uma cartomante: Madama Carlota. A cartomante mente para Macabéa, que sai de lá convencida de que será outra, de que será feliz e de que encontrará seu príncipe. Ao dar um passo para atravessar a rua, ela é atropelada por um carro Mercedes Benz ouro. Esta é a hora da estrela, quando ela será "tão grande como um cavalo morto": ferida de morte, a personagem vomita um pouco de sangue, mas queria ter vomitado "uma estrela de mil pontas". O narrador termina refletindo sobre a morte não só de Macabéa, mas também sobre a dele: "por enquanto é tempo de morangos. Sim".



......



"eu não decifrei a Esfinge, mas ela também não me decifrou".

Clarice Lispector                 

Cem Anos de Perdão




Quem nunca roubou não vai me entender. E quem nunca roubou rosas, então é que jamais poderá me entender. Eu, em pequena, roubava rosas.
Havia em Recife inúmeras ruas, as ruas dos ricos, ladeadas por palacetes que ficavam no centro de grandes jardins. Eu e uma amiguinha brincávamos muito de decidir a quem pertenciam os palacetes. "Aquele branco é meu." "Não, eu já disse que os brancos são meus." Parávamos às vezes longo tempo, a cara imprensada nas grades, olhando.
Começou assim. Numa dessas brincadeiras de "essa casa é minha", paramos diante de uma que parecia um pequeno castelo. No fundo via-se o imenso pomar. E, à frente, em canteiros bem ajardinados, estavam plantadas as flores.
Bem, mas isolada no seu canteiro estava uma rosa apenas entreaberta cor-de-rosa-vivo. Fiquei feito boba, olhando com admiração aquela rosa altaneira que nem mulher feita ainda não era. E então aconteceu: do fundo de meu coração, eu queria aquela rosa para mim. Eu queria, ah como eu queria. E não havia jeito de obtê-la. Se o jardineiro estivesse por ali, pediria a rosa, mesmo sabendo que ele nos expulsaria como se expulsam moleques. Não havia jardineiro à vista, ninguém. E as janelas, por causa do sol, estavam de venezianas fechadas. Era uma rua onde não passavam bondes e raro era o carro que aparecia. No meio do meu silêncio e do silêncio da rosa, havia o meu desejo de possuí-la como coisa só minha. Eu queria poder pegar nela. Queria cheirá-la até sentir a vista escura de tanta tonteira de perfume.
Então não pude mais. O plano se formou em mim instantaneamente, cheio de paixão. Mas, como boa realizadora que eu era, raciocinei friamente com minha amiguinha, explicando-lhe qual seria o seu papel: vigiar as janelas da casa ou a aproximação ainda possível do jardineiro, vigiar os transeuntes raros na rua. Enquanto isso, entreabri lentamente o portão de grades um pouco enferrujadas, contando já com o leve rangido. Entreabri somente o bastante para que meu esguio corpo de menina pudesse passar. E, pé ante pé, mas veloz, andava pelos pedregulhos que rodeavam os canteiros. Até chegar à rosa foi um século de coração batendo.
Eis-me afinal diante dela. Para um instante, perigosamente, porque de perto ela é ainda mais linda. Finalmente começo a lhe quebrar o talo, arranhando-me com os espinhos, e chupando o sangue dos dedos.
E, de repente - ei-la toda na minha mão. A corrida de volta ao portão tinha também de ser sem barulho. Pelo portão que deixara entreaberto, passei segurando a rosa. E então nós duas pálidas, eu e a rosa, corremos literalmente para longe da casa.
O que é que fazia eu com a rosa? Fazia isso: ela era minha.
Levei-a para casa, coloquei-a num copo d'água, onde ficou soberana, de pétalas grossas e aveludadas, com vários entretons de rosa-chá. No centro dela a cor se concentrava mais e seu coração quase parecia vermelho.
Foi tão bom.
Foi tão bom que simplesmente passei a roubar rosas. O processo era sempre o mesmo: a menina vigiando, eu entrando, eu quebrando o talo e fugindo com a rosa na mão. Sempre com o coração batendo e sempre com aquela glória que ninguém me tirava.
Também roubava pitangas. Havia uma igreja presbiteriana perto de casa, rodeada por uma sebe verde, alta e tão densa que impossibilitava a visão da igreja. Nunca cheguei a vê-la, além de uma ponta de telhado. A sebe era de pitangueira. Mas pitangas são frutas que se escondem: eu não via nenhuma. Então, olhando antes para os lados para ver se ninguém vinha, eu metia a mão por entre as grades, mergulhava-a dentro da sebe e começava a apalpar até meus dedos sentirem o úmido da frutinha. Muitas vezes na minha pressa, eu esmagava uma pitanga madura demais com os dedos que ficavam como ensanguentados. Colhia várias que ia comendo ali mesmo, umas até verdes demais, que eu jogava fora.
Nunca ninguém soube. Não me arrependo: ladrão de rosas e de pitangas tem 100 anos de perdão. As pitangas, por exemplo, são elas mesmas que pedem para ser colhidas, em vez de amadurecer e morrer no galho, virgens.

Clarice Lispector  

Me identifiquei!



"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."